29.12.17

O NATAL, num poema (quase) inédito de José Gomes Correia

SAUDADE...

É noite de Natal... Lá fora a neve branca
Cai silenciosamente; e todo o povoado
É um canto de luz, um ninho abençoado,
Uma ardente oração a Deus sublime e franca!

Sorrisos de alegria emanam dos casais,
Uma onda venturosa esparge em cada lar
Uma chama de amor, brilhando em cada olhar,
Carícia de Jesus nas almas imortais!...

Só ele o pobre velho, o órfão de carinhos,
Treme de frio; e a fome empresta amargo pranto
Ao seu cansado olhar, que busca em cada canto
O seu saudoso lar de fogos pobrezinhos!

Nascera lá na serra havia muitos anos...
Ali passara sempre a vida descuidada,
Ali crescera e amara a moça mais prendada,
Triste manancial de tantos desenganos!

Um dia, ela morreu... tocavam as trindades...
O vento soluçava e as aves nos beirais
Pareciam chorar... e as vozes dos trigais
Eram sentida prece, um hino de saudades!

Depois... ele partiu! Levava para longe
As mil recordações dos tempos que passaram,
Correra o mundo inteiro e nunca se acabaram
As lágrimas de dor no seu viver de monge!

Sentia-se vélhinho... iria prós oitenta...
Q´ria ver outra vez a terra, onde nascera,
Q´ria sentir ainda o gozo da quimera...
Um frémito de amor o peito lhe acalenta!

Sentia-se já perto... eram as mesmas águas
Correndo mansamente, as mesmas casas velhas,
O mesmo tilintar de guisos das ovelhas,
A mesma campa em flor, jardim das suas mágoas!

Sentia que  revivia a sua mocidade,
O seu corpo de velho à luz sentimental
Do abençoado ninho em noite de Natal,
Á sombra enganadora e vã da realidade!
- José Gomes Correia (poeta nisense)