15.1.14

MEMÓRIA HISTÓRICA: Doenças venéreas, armadilhas para caçar e o direito ao voto

As actas e outros documentos do Arquivo da Câmara Municipal constituem um acervo documental de grande relevância para conhecermos situações, histórias, o modus vivendi, em diversos domínios, da população do concelho e das instituições. Hoje, transcrevemos aqui alguns documentos datados de 1901, tendo o cuidado de modificar alguns nomes de pessoas para não ferir susceptibilidades.
Moléstias venéreas (I)
Carta ao Dr. João Moraes, Facultativo Municipal do Crato e que presta serviço em Toloza
Tendo recebido queixa n´esta Administração de que Genoveva Romão *, solteira, da Villa de Toloza d´este Concelho, se acha atacada de molestia venerea e que contaminou a menor Maria Isabel *, de 6 annos de edade, filha de João Caldeira *, casado, carpinteiro da mesma Villa, vou rogar a Vª Exª se digne examinar as pessoas a que me refiro e communicar-me com a brevidade possivel o que ha de verdade sobre tal molestia.
Deus guarde a Vª Exª / Niza, 22 de fevereiro de 1901
* Estes nomes são fictícios
Moléstias venéreas (II)
Carta ao Delegado do Procurador Regio n´esta Comarca
Para os fins convenientes tenho a honra de passar às mãos de Vª Exª o incluso auto de noticia. N´esta data officio ao Snr. Facultativo, Dr. Moraes que presta serviço clinico em Toloza, a fim de me informar se a arguida e a menor Maria Isabel a que se refere o mesmo auto, estão ou não contaminadas de molestia venerea. Da informaçãoque obtiver darei conta a Vª Exª.
Deus guarde Vª Exª. / Niza, 22 de fevereiro de 1901.
A propósito do Direito ao Voto
Carta enviada ao Governador Civil
Em resposta à circular sob o nº 1068 que Vª Exª se dignou enviar-me no dia 21 de dezembro de 1900, tenho a responder que a minha fraca e humilhissima opinião junctamente com a pouca experiencia que tenho em assumptos eleitoraes, me ditam o seguinte: As varias reformas por que tem passado a lei eleitoral, comquanto tenham tendido a dar a mais ampla liberdade ao voto, e se funda em theorias, mais ou menos em harmonia com os principios liberaes não se coadunam com a practica no todo, porque emquanto houver homens, ha de haver interesses, luctas pelos mesmos e grande dependencias, d´onde de ahi aquella não harmonia. A ultima lei eleitoral parece-me sufficiente, porquanto nas passadas eleições, a bôa vontade, energia, competencia e moralidade do homem que preside à Administração Superior do nosso Paiz, mostraram eloquentemente que com ella se podem fazer eleições, com a maxima liberdade, compativel com os interesses partidários e sem violencias. Comtudo, como esta circunstancia é puramente eventual, porque depende das qualidade moraes do individuo que preside ao governo do Paiz, é minha opinião e de harmonia com os principios que deixo expostos, que o direito ao voto seja restringido, mais do na actual lei, facultando-se apenas a individuos que pela sua illustração e condições de fortuna pessoal, offereçam mais garantias de independencia.
Deus guarde Vª Exª. / Niza, 12 de fevereiro de 1901
Apanhado a armar ferros
Carta ao Delegado do Procurador Regio n´esta Comarca

De harmonia com o preceituado no artigo 278 nº 27 do Codigo Administrativo, cumpre-me participar a Vª Exª que Jose Constança *, solteiro, pastor, ao serviço de Manoel da Martinha foi encontrado no dia 17 por 7 horas da tarde no sitio denominado barroca do Valle Louro freguezia do Espirito Santo d´esta Villa, a armar trez ferros ou armadilhas aos coelhos, que n´essa ocasião lhe foram apprehendidos. Os apprehensores são Jose Maria Nunes e Jose da Cruz Miguens, cabos de policia e guardas da Associação protectora da caça em tempo defezo. Com este meu officio serão apresentados a Vª Exª os trez ferros apprehendidos. O arguido é natural d´esta Villa.
Deus guarde a Vª Exª. / Niza, 19 de Abril de 1901
* Nome fictício
Toleradas
Carta ao Sub-Delegado de Saude n´este Concelho
Accusada a recepção do officio que Vª Exª se dignou dirigir-me datado de 27 do corrente mez, cumpre-me dizer-lhe que não existindo n´esta Administração matricula ou qualquer registo de toleradas d´este Concelho, e, não indicando Vª Exª os nomes das pessoas que deseja inspeccionar torna-se-me completamente impossivel dar cumprimento ao citado officio de Vª Exª.
Deus guarde a Vª Exª. / Niza, 30 de Abril de 1901