21.1.12

AREZ: Valorização do património da Misericórdia *



Em Setembro de 2009 no I Encontro Internacional de Investigadores de História Moderna surgiu o primeiro contacto para a salvaguarda da Igreja da Misericórdia de Arez. Ponto comum entre a comunicação de Joana Pinho sobre a Arquitectura das Misericórdias quinhentistas e a tese de mestrado de Ana Leitão, estudo monográfico de Arez.
Desta dinâmica resulta a redacção deste texto como relato de boas práticas e forma de sensibilização para a preservação e valorização do património cultural das Misericórdias.
Destacando atitudes fundamentais na intervenção em património cultural: a interdisciplinaridade que assegura uma intervenção coerente, o diálogo entre técnicos e dono de obra, o envolvimento e participação da comunidade; um conhecimento académico credível que servirá de base às decisões e opções da intervenção.
Arez é actualmente uma freguesia do concelho de Nisa, com c. 56 km² e 256 habitantes. Foi vila e sede de concelho do séc. XII a 1836, comenda da Ordem de Cristo e teve foral por D. Manuel em 1517. Do seu património edificado destacam-se: Igreja Matriz e ermida de Santo António que sofreram campanhas de obras no séc. XX que alteraram significativamente as suas características. E também o edifício sede da Misericórdia de Arez composto por igreja, sacristia e outras dependências. Originalmente foi capela do Espírito Santo e com a fundação da Misericórdia de Arez em 1592 sofreu uma intervenção que se prolongou até ao séc. XVII. A planimetria, volumetria e características arquitectónicas do edifício integram-se numa corrente maneirista-chã de cariz regional. Do património móvel e integrado destacam-se o retábulo-mor, a escultura da Santíssima Trindade e as pinturas murais. As da nave, duas campanhas principais, representam retábulos fingidos seguindo modelos da retabulística nacional em madeira entalhada. Da primeira campanha fazem parte os retábulos com frontão contracurvado e colunas com capitéis coríntios, de finais do séc. XVIII. Já os retábulos de perfil neoclássico, com frontões triangulares e emblemas marianos,
pertencerão a uma campanha mais recente, talvez do séc. XIX.
Neste projecto desde o início foi considerado prioritário o envolvimento das várias áreas disciplinares relacionadas com o património. Nos inícios de 2010, as duas investigadoras e Patrícia Monteiro, que desenvolve tese de doutoramento sobre pintura mural do Alto Alentejo, realizaram uma visita ao edifício. A investigação resultante de trabalhos académicos produz conhecimento, em si mesmo de inegável valor, mas que ganha nova valia ao reverter para um caso concreto, torna-se conhecimento aplicado e com impacto na comunidade.
A nível técnico foram também contactadas a Direcção Regional da Cultura do Alentejo e o Gabinete do Património Cultural da União das Misericórdias Portuguesas.
Em Junho de 2011 realizou-se nova visita ao edifício com alunos do Curso de Especialização Tecnológica em Conservação e Restauro do Instituto de Artes e Ofícios da FRESS e o professor Joaquim Caetano que, além de ter constituído motivo de estudo, teve como objectivo delinear uma estratégia para a conservação das pinturas murais existentes na igreja.
O grupo foi recebido pelo Provedor José Fazendas e outros membros da Mesa Administrativa e do diálogo resultaram três ideias fundamentais: isolar o telhado com subtelha, evitar o uso de novos revestimentos à base de cimento e conservar e restaurar as pinturas murais pois, independentemente do seu valor estético, são testemunho do gosto de uma época.
Fez-se uma sondagem na parede fundeira da capela-mor onde se detectou pintura decorativa simulando silhares de azulejo enxaquetado do séc. XVII.
O diálogo estabelecido entre promotores da obra, técnicos de conservação e restauro e historiadores da arte evidencia os bons resultados que procedimentos deste tipo proporcionam, devendo servir como exemplo a outras intervenções.
Seguidamente procurou-se sensibilizar a comunidade local para a importância do património cultural, da sua conservação e o seu envolvimento no projecto; mobilizando-se a Comissão de Festas de Arez de 2011 para a angariação de fundos que reverteram para a intervenção.
Após este processo, no verão de 2011, iniciou-se a intervenção nos telhados, rebocos e pavimentos que estará concluída no início de 2012 e definiram-se projectos futuros para o património cultural da Misericórdia de Arez: novas sondagens na capela-mor e a instalação do recuperado arquivo histórico da Misericórdia numa das dependências do edifício.
* Ana Santos Leitão, Joana Balsa de Pinho, Joaquim Caetano e Patrícia Monteiro
- Texto publicado no mensário “Voz das Misericórdias” – Dezembro 2011